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terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

Antonieta de Barros, a primeira mulher negra eleita deputada no Brasil


 

Para que possamos superar nossos pobres hábitos e irmos além de vícios e preconceitos, é sempre preciso que alguém tenha a coragem do primeiro gesto – para enfrentar, muitas vezes na solidão do próprio destemor, aqueles que insistem em querer manter o mundo em um passado excludente que não cabe mais, não pode mais caber, em tempo algum. Para alguém que não é de Santa Catarina, o nome Antonieta de Barros pode soar completamente inédito. Mas se temos qualquer apresso por igualdade de gêneros, racial, liberdade de expressão, pela educação como um meio de mudar e melhorar nossa realidade, conhecendo-a ou não ela também é nossa heroína.

Nascida em 11 de julho de 1901, Antonieta surgiu junto com um novo século, em que as desigualdades de oportunidade e de direitos teriam de ser revistas e transformadas a qualquer custo. E não foram poucas as barreiras superadas: mulher, negra, jornalista, fundadora e diretora do jornal A Semana (entre 1922 e 1927), Antonieta teve de impor seu lugar e sua fala em um contexto nada afeito às opiniões e à força feminina – coragem essa que viria lhe catapultar à condição de primeira mulher deputada do estado de Santa Catarina, e à primeira deputada estadual negra do Brasil.

 Florianópolis no início do século XX

Filha de uma lavadeira e escrava liberta com um jardineiro, Antonieta nasceu 13 anos somente após o fim da escravidão no Brasil. Muito cedo se tornou órfã de pai, e sua mãe então, para ampliar o orçamento, transformou a casa em uma pensão para estudantes em Florianópolis. Foi através dessa convivência que Antonieta se alfabetizou, e assim começou a entender que, para se libertar do destino nada generoso reservado às jovens negras, seria preciso o extraordinário, e assim conseguir escavar um outro caminho para si. E, na época como ainda hoje, o extraordinário reside na instrução. Pela educação que Antonieta pôde libertar-se também da escravidão social que naturalmente lhe era imposta, apesar da abolição. Cursou regularmente a escola e o curso normal até se formar professora.


 Antonieta entre colegas intelectuais e acadêmicos

Em 1922 fundou o curso de alfabetização Antonieta de Barros, em sua própria casa. O curso seria dirigido por ela, com austeridade e dedicação que lhe faria conquistar respeito até entre as mais tradicionais famílias brancas da ilha, até o fim da sua vida, em 1952. Por mais de 20 anos colaborou com os principais jornais de Santa Catarina. Seus ideias foram compilados no livro Farrapos de Ideias, que assinou com o pseudônimo de Maria da Ilha. Antonieta nunca se casou.
 As alunas do curso de Antonieta, com a professora em destaque

O Brasil em que Antonieta se formou educadora, fundou um jornal e ministrou um curso alfabetizante era um país em que mulheres não podiam sequer votar – direito que só se tornou universal por aqui em 1932. Supor a coragem exigida para que, em contexto como esse, uma mulher negra publicasse o seguinte parágrafo assombra e inspira: “A alma feminina se tem deixado estagnar, por milhares de anos, numa inércia criminosa. Enclausurada por preconceitos odiosos, destinada a uma ignorância ímpar, resignando-se santamente, candidamente, ao deus Destino e a sua congênere Fatalidade, a Mulher tem sido, de verdade, a mais sacrificada metade do gênero humano. Tutelada tradicional, irresponsável pelos seus atos, boneca-bibelot de todos os tempos".

 Antonieta sentada entre seus colegas parlamentares, no dia de sua posse em 1935

É também espantoso e profundamente sintomático sobre o próprio Brasil que as três causas da vida e luta de Antonieta (e, nesse caso, vida e luta são uma coisa só) permaneçam pautas centrais, ainda a serem alcançadas: educação para todos, valorização da cultura negra e emancipação da mulher. A própria campanha de Antonieta, em 1934, mostrava claramente com quem falava a candidata, e o tipo de enfrentamento exigido para que uma mulher negra pudesse sonhar em ser aquilo que, para os homens brancos, era oferecido como um futuro acessível: “Eleitora. Tens em Antonieta de Barros a nossa candidata, o símbolo das mulheres catarinenses, queiram ou não os aristocratas de ontem”. A ditadura do Estado Novo viria a interromper seu mandato como deputada, em 1937. Dez anos depois, em 1947, porém, ela seria novamente eleita.


Reconhecimento

Mesmo que já se tenha ouvido falar em Antonieta, a verdade é que o próprio cabimento de tal questão aponta certo absurdo ainda fatal sobre a natureza do Brasil como um todo. Pois para um Brasil livre e igualitário, Antonieta de Barros tem de ser nome tão comum e repetido quanto (ou muito mais do que) Duque de Caxias, Marechal Rondon, Tiradentes ou todos os presidentes ditatoriais que seguem batizando ruas e escolas pelo país.

 A ativista americana Rosa Parks

Peguemos o exemplo de Rosa Parks, a ativista norte-americana que, em 1955, recusou-se a ceder o lugar para um passageiro branco no ainda segregado estado do Alabama. Rosa foi presa, mas seu gesto terminou por disparar uma sucessão de revoltas e resistências por parte do movimento negro que levaria ao grande levante pelos direitos civis (conquistando o fim da segregação e a igualdade de direitos no país) e tornaria seu nome imortal.

 Rosa Parks detida, em 1955

A quantidade de prêmios e homenagens recebidas pela ativista (assim como de ruas, prédios públicos e monumentos batizados com seu nome) é incalculável, e não só nos EUA; o esforço por torna-la símbolo incontornável do movimento social e da luta pela igualdade de direitos é, em certa medida, um mea culpa possível, realizado pelos próprios EUA, a fim de reparar um pouco ao menos o horror capitaneado pelo governo contra a população negra, apesar da ainda intensa desigualdade que reina por lá (e que a possível eleição de um Donald Trump não venha a contrariar essa impressão).




Pois o país que pretendemos construir no futuro é proporcional ao lugar em que colocamos nosso verdadeiros heróis e heroínas do passado – ou nem isso: o futuro do país é equivalente à qualidade de quem consideramos herói ou heroína em nossa história. Antonieta não viveu para ver um país melhor redimir sua luta e o próprio valor da educação, do negro e da mulher na sociedade brasileira.





A voz de uma mulher como Antonieta precisa em muito ser elevada. Toda e qualquer conquista civil, desde então e para o futuro, serão também necessariamente frutos de sua luta, pois, em suas próprias palavras, “Não será a tristeza do deserto presente que nos roube as perspectivas dum futuro melhor (..), onde as conquistas da inteligência não se degenerem, em armas de destruição, de aniquilamento; onde os homens, enfim, se reconheçam fraternalmente. Será, contudo, quando houver bastante cultura e sólida independência entre as mulheres para que se considerem indivíduos. Só então, cremos existir uma civilização melhor.”



© fotos: divulgação

sábado, 18 de fevereiro de 2017

COSA NOSTRA: Maior Máfia Italiana

  
A história da Cosa Nostra pode ser dividida em quatro fases. A primeira, inicia-se quando o rei de Nápoles editou um Decreto, em 1812, para eliminar as “forças populares”, que haviam surgido no Sul da Itália, mas, principalmente, para diminuir o poder que surgia na Sicília. Os Senhores Feudais, para resistir a tal decreto, contrataram indivíduos, chamados de “homens de honra”, criando assim uma espécie de sociedade secreta que se denominaram “Máfia”. Essa fase não é ainda um período mafioso, propriamente dito, mas um período pré-mafioso.
A segunda fase inicia-se com o desaparecimento do Reino de Nápoles, quando essas sociedades secretas passaram a lutar contra as dinastias espanholas e francesas, que sucederam ao trono de Nápoles. A Máfia deixou de ser uma sociedade secreta e se tornou uma sociedade de resistência aos invasores. O povo simpatizou com a Máfia por ser patriótica.
Passou a contar com mais de 100 mil camponeses que se insurgem contra Roma, surgindo a cultura do estresse entre as famílias, gerando hostilidade nas relações adversas que surgiam fazendo com que a defesa da honra significava sobrevivência.
A única base de lealdade era a sanguínea e criou-se a cultura da obediência às regras próprias, quais sejam, a não cooperação com as autoridades e a retaliação a qualquer ofensa a um membro da família.
Essa fase foi de uma “máfia agrária” cuja principal luta foi contra os proprietários de terras que se concluiu somente com a derrota dos movimentos camponeses e com o forte fluxo migratório, quando a agricultura cedeu espaço ao setor produtivo.
Com a miséria que abate a região sul da Itália, no final do século XIX e início do século XX, os mafiosos viajam pela Itália em busca de melhores condições de vida. Mais pobres e rejeitados, se organizam em uma sociedade de autodefesa e criminalizam-se. Para o povo, a máfia era um grupo de camponeses violentos, de “sangue quente” que comumente faziam desafios com final de homicídios. Acontece que, desde 1890, a máfia já era uma sociedade organizada e dotada de poder político com ações internacionais, fraudes e com manobras financeiras.

O aumento da renda permitiu o fortalecimento da sede na Sicília e a diversificação das atividades ilegais realizadas pela máfia.
A terceira fase surge com a instalação de parte da sociedade nos Estados Unidos da América, formando as famílias italianas da América. As famílias eram compostas de parentes, incluindo os norte-americanos e suplementadas por pessoas conhecidas por amigos, que eram indicadas por parentes.
Essa fase é urbano-empreendedora, até o final da década de 1960, em que os mafiosos proliferam-se e se inserem especialmente no setor da construção civil.
A quarta e última fase tem seu início na década de 1970 quando se observa a transformação da “máfia-empreendedora” em “máfia-financeira”. Em um primeiro momento, a Cosa Nostra possuía como grande negócio o contrabando de cigarros e a corrupção em obras públicas. Posteriormente, o principal negócio se tornou o tráfico de entorpecentes.
Os mafiosos, entre os anos de 1940 e 1990, passaram a controlar as eleições na Sicília, adquirindo, assim, certo poder junto à Roma.
A Cosa Nostra se tornou a maior e mais poderosa Máfia, com aproximadamente 180 clãs.
Dois meses depois de Falcone, à esquerda, ter sido assassinado,
 outro juiz anti-máfia, Paolo Borsellino, foi morto num atentado
Através do trabalho sério de autoridades, especialmente do Juiz Giovanni Falcone e do Procurador Paolo Borsellino, ambos assassinados, posteriormente, por membros da máfia, foi descoberta a estrutura mafiosa, que é a seguinte:
A família é a base da organização e controla um bairro ou uma cidade inteira, sendo constituída de homens de honra, “soldados”, agrupados em número de dez. Cada grupo é coordenado por um “capodecina”. Os membros da família elegem o Capo-Família que é assistido por um “Consigliere”, ou seja, assessor. Este é, normalmente, uma pessoa de notável esperteza, sagacidade e é auxiliado por vicecapi (subchefes).
A união de três ou mais famílias, cujas áreas de atuação sejam contíguas, constitui um “mandamento” e nomeiam um “capomandamento”, normalmente um Capo-Família, mas pode ser uma pessoa diferente.
Os capomandamenti constituem uma estrutura colegiada, chamada de “Copola”, que possui a função de garantir as regras da Máfia e de “compor as vertentes da Família” (MENDRONI, 2009, p. 295). A “Copola” é presidida por um dos capimandamento que é chamado de Secretário ou Capo.
Existe, ainda, um colegiado superior, chamado interprovinciale, mas que pouco se sabe acerca do mesmo, mantendo um caráter secreto e misterioso.
Uma das características mais marcantes da Cosa Nostra é que ela se assemelha a um Estado, uma vez que exerce domínio territorial e “taxa” as suas atividades de “proteção”. Aqueles que pagam à Máfia recebem proteção. Os que não pagam, são intimidados e agredidos pelos membros da Cosa Nostra.
Além disso, a ingerência no Estado também é muito marcante, através de subornos e corrupção da máquina estatal.
“A Cosa Nostra, segundo um levantamento da Direzione Centrale della Polizia Criminale de 1995, contava com 5.487 integrantes na Sicília, sendo maior a quantidade no eixo Palermo – Catânia. Palermo teria 59 grupos com 1.492 afiliados e Catânia nove grupos com 1.476 afiliados; sendo os demais distribuídos entre Trapani, Messina, Agrigento e Siracusa” (DI CAGNO apud MENDRONI, 2009, p. 303).
Juiz Giovanni Falcone

Fonte: Rafael de Rezende Lara

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